larguei o adam levine. vou-me casar com um carteiro. o único requisito é chamar-se adam levine.

ando a recolher assinaturas para encaminhar um documento para o sindicato dos carteiros. o meu plano é passarmos a receber encomendas apenas a partir das 14h, quem sabe, 15h. e, se os carteiros fizerem mesmo questão de entregar as encomendas de manhã, são obrigados a trazerem pequeno-almoço. esta ideia surgiu-me porque sou sempre eu a receber as encomendas cá em casa. e o problema é que é sempre de manhã - tão de manhã que, na maioria das vezes, o som da campainha é o meu despertador. quando os meus pais ou meu irmão me dizem "amanhã deve chegar uma encomenda", eu começo logo a fazer planos de como agir. acordar já é difícil. acordar e ter imediatamente de ter interação humana quando nem do meu nome me lembro e ter de assinar papéis quando os meus olhos ainda têm aquilo a que eu chamo película de sono a tapar-me a visão para receber uma encomenda, é muito mais difícil do que pensar no que vou comer ao pequeno-almoço - daí a minha ideia dos carteiros trazerem já o nosso pequeno-almoço.

tinha uns 15 anos quando recebi a minha primeira encomenda - receber uma encomenda não é uma data para ser relembrada, só decorei a idade porque foi quando recebi a minha primeira guitarra. correu tudo bem, dentro dos possíveis que a minha ansiedade social permite. a partir daí, foi sempre a descambar. as últimas duas encomendas que recebi foram recebidas demasiado cedo e, como tal, correram pior do que o habitual. numa delas, o carteiro tinha uma caixa nos braços e, quando ia para me dar, perguntou:
- posso?
- pode! - respondi, na minha inocência, ao pensar que a caixa, apesar de enorme, parecia leve.
quando ele colocou a caixa nos meus braços, só tive tempo de me virar para trás e cair em cima do tapete com a caixa que, agora, mais parecia ter um javali dentro. exclamei qualquer coisa que não me lembro.
- pois, é um bocadinho pesada... - exclamou o carteiro, provavelmente ao perceber que eu estava em apuros.
- é... só "um bocadinho"... - pensei.

na última vez que recebi uma encomenda, acordei para ir abrir a porta e ainda tive de andar à procura da camisola do pijama à pressão para não receber o carteiro em tronco nu - o que, penso eu, para ele seria normal porque uma vez vi no você na tv uma reportagem sobre carteiros e diziam que há imensas pessoas que os atendem completamente nuas. bem, eu acho que o meu ar de zombie ao acordar já é suficientemente assustador. para piorar a situação, como vivo no 1º andar, o carteiro chega num instante. mas, nesse instante, consegui encontrar a camisola - cada vez que quiser encontrar alguma coisa, vou chamar um carteiro. abri a porta.
- bom dia! - disse o carteiro. homem simpático.
- bom dia! acabei de acordar... - estava a tentar-me desculpar pelo meu estado físico lastimável, que, por acaso, era mais que óbvio e ele já devia ter reparado ainda nem eu tinha aberto a porta.
- se estivesse em casa, também estava a dormir agora! - respondeu.
- e eu queria tanto que estivesse em casa a dormir para não estarmos agora nesta situação embaraçosa - pensei. mas limitei-me a sorrir. pelo menos, ainda não tinha comido e não corria o risco de ter um bocado de pão no meio dos dentes.
entretanto recebi a encomenda e ele pediu-me para assinar numa daquelas máquinas do demónio. eu, que tenho uma letra de criança bastante percetível, tinha acabado de assinar com letra de médico. pensei que, finalmente, a puberdade tinha atingido a minha letra. tentei não ser tão positiva e apercebi-me da borrada que estava a fazer.
- hmm... isto está a correr mal. não dá para assinar outra vez? - perguntei.
- pois... não dá... assina aí qualquer coisa! - entreguei-lhe a máquina. - qual é o teu nome?
- ana luísa.
quando nos despedimos e fechei a porta, lembrei-me que não tinha dito o meu apelido.
- oh meu deus! vai acabar por voltar para me perguntar o apelido... - pensei.

mas não voltou. teve de me ver descabelada, com um pijama velho, os olhos cobertos de remelas e com voz de bagaço matinal nas primeiras horas do dia. se voltasse, já tinha um aro de cebola como aliança à espera dele e eu estava pronta para nos casarmos. aliás, ter logo um primeiro encontro nestas condições e ainda voltar, é sinal que vamos ter um casamento duradouro. pensando bem, vou largar a ideia das assinaturas e vou começar a fazer encomendas inúteis só para receber carteiros todos os dias a ver se algum deles escorrega na minha desgraça matutina.

3 comentários:

  1. Também já passei por situações idênticas. :D
    Neste momento, os carteiros aqui da zona, andam preguiçosos (deve ser do sol) porque nem tocam à campainha, deixam directamente o aviso na caixa de correio e a pessoa que levante a encomenda nos CTT se quiser. Ora, bolas!
    Não adianta reclamar nos CTT, porque... vai dar ao mesmo, ou seja, nada.
    Enfim!

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  2. ahahah, gajas que recebem encomendas em tronco nu são, talvez, o único incentivo à profissão de carteiro. Mesmo descabeladas e com ramelas, sempre é mais agradável do que ser mordido pelo cão. xD

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  3. Acho que todos nós temos situações "embaraçosas" com o carteiro xp
    Eu tenho sorte que na minha zona o carteiro passa sempre por volta da hora do almoço :D

    Beijinhos, O blog da Mó | Instagram

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